De Sebastião Nery
RIO – Em 1943, Getulio Vargas, Presidente, foi a São Paulo para comemorações na 2ª Região Militar, comandada pelo general Mascarenhas de Morais. Com ele, o interventor Fernando Costa, o secretario da Fazenda Coriolano de Góes e o filho, ainda garoto, Virgilio de Góes.
Houve um campeonato de “tiro aos pombos”. Participava o campeão nacional, major da 2ª Região, que nunca errava uma: o pombo voou, derrubava. Naquele dia, o major estava de azar.
Voou o primeiro pombo, “paaa”, errou. Voou o segundo, “paaa”, errou. Voou o terceiro, “paaa”, errou de novo. O major ficou encabulado, vermelho, aflito, desistiu. O menino Virgílio puxou o braço do pai:
- Pai, ele não é o campeão? Por que não acertou nem uma vez?
- Cala a boca, menino!
Não adiantava. O major já tinha ouvido. Getúlio também. Getúlio tirou o charuto da boca, consolou o major:
- Major, o senhor atira bem. Os pombos é que voam mal.
CEXIM
Dez anos depois, 1953, Getúlio Vargas novamente Presidente. Jânio prefeito de São Paulo. Carvalho Pinto secretário da Fazenda de São Paulo. Coriolado de Góes,diretor-geral da Cexim(Comissão do Comercio Externo)
Uma tarde, aparecem no gabinete do diretor da Cexim, no Rio, Jânio e Carvalho Pinto. Precisavam de uma licença especial do governo para importação, da Alemanha, de peças para os ônibus da CMTC, a empresa municipal de ônibus. O chefe de gabinete, Virgilio de Góes, filho do diretor, lhes diz que o pai não costumava receber ninguém à tarde, mas que, evidentemente, tratando-se do prefeito de São Paulo, a exceção era normal.
JANIO
Jânio entrou no gabinete, ficou duas horas, resolveu o problema, saiu sorrindo. Chamou Virgílio, pegou-lhe as duas mãos, encostou-as ao peito, entortou os olhos, dobrou as canelas e lhe disse pateticamente:
- Meu jovem, devo-lhe a salvação da CMTC.
- Nada disso, prefeito. É apenas dever do governo federal ajudar a prefeitura de São Paulo.
- Quero que me diga, qualquer dia em que precisar de alguma coisa, o que deseja. Fa-lo-ei imediatamente.
Foi saindo, voltou sobre os calcanhares retorcidos:
- Nem precisa telefonar. Pense, apenas pense, que eu o atenderei.
VIRGILIO Virgilio de Goes, advogado de carreira do Banco do Brasil, era da confiança absoluta de Leonel Brizola. Criado o PDT em 1981, foi tesoureiro da Comissão Executiva Nacional (Brizola presidente, Doutel de Andrade vice, José Frejat secretario-geral, eu secretario nacional, e outros) até 1996. Brizola governador, foi diretor-financeiro do BANERJ (1982-86).
No segundo mandato de Brizola, foi presidente do Metrô de
Inteligente, competente, honrado, bem falante, simpático, conhecia os políticos brasileiros desde Getulio, sempre acompanhando o pai, o baiano Coriolano de Goes, que começou na Republica Velha como chefe de Policia do Distrito Federal, no Rio, no governo de Wahington Luis, de
Nas reuniões da Executiva Nacional do PDT, quando alguém do governo Brizola ia mal, Virgilio procurava ajudar, contando a historia do major campeão de “tiro aos pombos”, dizendo que talvez a culpa não fosse do companheiro mas dos pombos, dos problemas que estavam voando mal.
Meu amigo Virgilio morreu esta semana aqui no Rio, aos 85 anos.
SARNEY
Saber viver não é fácil. Mas é patético não saber envelhecer. O discurso do senador José Sarney no Senado foi uma obra prima de tentativa de disfarce. Ele é o presidente do Senado que, sob o seu comando, está há quatro meses afundando. Mas a crise do Senado não é dele, é do Senado.
A conta do banco onde era depositado o auxilio-moradia que ele não podia receber, porque tem a casa oficial do Senado, era dele. Mas Sarney não sabia. O neto é dele. Passou dois anos pendurado no gabinete do senador Cafeteira, eleito por ele no Maranhão. Mas Sarney não sabia.
O neto foi obrigado a sair, porque era nepotismo, e em lugar do neto foi posta a mãe do neto. Mas Sarney não sabia. As duas sobrinhas eram dele, nomeadas no escuro, a pedido dele. Mas Sarney não sabia.
O INJUSTIÇADO
O impudor do discurso a Nação inteira viu e ouviu. Chegou ao extremo de queixar-se, a voz tremula, quase chorando, de que estava sendo “injustiçado, depois de 50 anos vida publica, a serviço do Brasil”.
A entrevista de Sarney à “Folha” foi a abertura do espetáculo:
1. - “Eu tenho um nome que deve ser julgado com respeito. Tenho uma biografia. Nunca alguem associou minha vida publica ao nepotismo”
2. - “Tudo está sendo analisado... Vamos examinar...Estamos tentando apurar...Eu pelo menos nunca soube”...
Sarney não tem culpa de nada. A culpa é dos pombos, que voam mal.
Seu livro “Testamento para Roseana” é “Emaranhado para Roseana”. www.sebastiaonery.com.br
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