quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

E por falar em estátua...

Do blog do Josias de Souza
http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br

Pela sétima vez, 'afanaram' os óculos de Drummond

No seu “Claro Enigma”, Carlos Drummond de Andrade usou como epígrafe um verso de Paul Valéry: “Lês événements m’ennuient”.

Em tradução livre: Os acontecimentos me entediam. Ou, se quiser, me chateiam.

Hoje, nada deve aborrecer mais o poeta do que o vandalismo a que vem sendo sistematicamente submetida a estátua de Drummond.

Assentada num banco do calçadão de Copacabana, a estátua amarga, pela sétima vez, o furto de seus óculos.

Nem sinal dos vândalos. Vai-se repetir a rotina:

Empresa contratada pela prefeitura restituirá a armação ao dono.

E ela será danificada e subtraída novamente.

No dizer de Machado de Assis, o sono é uma forma interina de morrer.

Adormecendo, o sujeito se afasta da canseira da vida.

Com a vantagem de levar para o leito um bilhete de volta.

No caso de Drummond, o sono é definitivo. E o retorno, eterno.

O poeta renasce cotidianamente nas dobras da genialidade de seus escritos.

A estátua de Copacabana deveria inspirar o respeito dos vivos a um morto que, por imortal, permanece em cena como um personagem insone.

Se lhe fosse dado falar, a estátua de Drummond talvez trocasse Paul Valéry por Joaquim Nabuco.

Em momento de rara inspiração, Nabuco inventou a Nossa Senhora do Esquecimento.

‘Notre Dame de l’Oubli’, como ele preferia dizer, em francês.

O Brasil tem fama de país sem memória. Talvez seja mesmo.

Só uma sociedade demente é capaz de tratar o seu passado ilustre com tamanha falta de respeito.
Escrito por Josias de Souza às 21h04

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